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Por que hipocondríacos morrem mais cedo?

Por Fernando Reinach – Estado de SP

Quando investigações científicas produzem conclusões que são o oposto do que esperamos intuitivamente, eu sinto uma pontada de prazer. Se nossa intuição estivesse sempre correta, a ciência seria dispensável. É o caso da descoberta que os hipocondríacos morrem mais cedo. Intuitivamente, pessoas que se preocupam obsessivamente com sua saúde deveriam viver mais.

Desde que o ser humano descobriu que a morte é inevitável, cada um de nós desenvolveu uma ponta de hipocondria. Uma dor abdominal pode ser uma apendicite, uma pinta um melanoma. É normal e desejável nos preocuparmos com a saúde. Mas, quando essa preocupação é exagerada, ocupa totalmente nosso universo mental e, por causa do um alto nível de ansiedade, podemos ser diagnosticados com hipocondria, uma doença psiquiátrica bem caracterizada.

Principal hipótese apontada pelos pesquisadores é a pouca importância que os médicos dão à hipocondria como uma doença psiquiátrica séria
Principal hipótese apontada pelos pesquisadores é a pouca importância que os médicos dão à hipocondria como uma doença psiquiátrica séria Foto: motortion – stock.adobe.com

Essas pessoas estão continuamente preocupadas com sinais ou sintomas de doenças, procuram auxílio médico constantemente e se automedicam. Apesar de causar grande sofrimento, a hipocondria não é levada a sério o suficiente pelos médicos e pela sociedade. Esse trabalho pode mudar essa atitude.

O estudo foi feito na Suécia, que possui um sistema de saúde público, universal e muito bem organizado. Entre janeiro de 1997 e dezembro de 2020, foram identificadas 4.129 pessoas diagnosticadas com hipocondria.

Cada uma dessas pessoas foi pareada, no momento da inclusão no estudo, com 10 pessoas do mesmo sexo, idade, características físicas e educacionais. Assim, o grupo de estudo foi composto por 4.129 pessoas com hipocondria e 41.290 sem a doença. Só foram incluídas pessoas com mais de seis anos para evitar erros de diagnóstico.

Ao longo desses 23 anos, foram identificadas todas as mortes que ocorreram nos dois grupos, tanto as mortes por motivos naturais (doenças) como por outros motivos (acidentes, suicídio). Durante o período de estudo, 268 pessoas com hipocondria e 1.761 do grupo controle faleceram. Isso equivale a uma taxa de mortalidade de 5,5 mortes por 1.000 pessoas-ano na população controle e 8,5 mortes por 1.000 pessoas-ano entre os hipocondríacos.

Esse aumento na mortalidade entre os hipocondríacos foi observado tanto nas pessoas que morreram de causas naturais quanto de causas não naturais. Entre os que morreram de causas não naturais a razão principal da diferença foram os suicídios. Já o aumento das mortes por causas naturais entre os hipocondríacos se deve a um aumento de mortes por doenças respiratórias, circulatórias e do sistema nervoso. Não foi observado um aumento no número de casos de câncer.

Esse resultado mostra de maneira inquestionável que pessoas diagnosticadas com hipocondria têm uma taxa de mortalidade maior. A questão é explicar os motivos dessa diferença, uma vez que pessoas que se preocupam muito com sua saúde deveriam ser diagnosticadas e tratadas mais rapidamente.

Os cientistas levantam algumas hipóteses para explicar seus achados. A principal é a pouca importância que os médicos dão à hipocondria como uma doença psiquiátrica séria. O estudo mostra que as taxas de suicídio são mais altas entre os hipocondríacos, o que por si só demonstra a seriedade da doença e o nível de sofrimento que ela causa.

Para explicar o aumento de mortes por motivos naturais, os cientistas invocam o alto nível de ansiedade entre os pacientes, que pode deprimir o sistema imune, mas também lembram que pacientes hipocondríacos acabam recebendo menos atenção dos médicos quando relatam sintomas, exatamente por serem considerados hipocondríacos.

A conclusão dos cientistas é de que essa diferença na taxa de mortalidade entre os hipocondríacos poderia ser reduzida se os médicos levassem mais a sério a gravidade da doença e tratassem de forma mais agressiva esses pacientes. Ou seja, hipocondria não é um traço de personalidade, mas uma doença séria que precisa ser tratada.

 

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Opinião por Fernando Reinach

Biólogo, PHD em Biologia Celular e Molecular pela Cornell University e autor de “A Chegada do Novo Coronavírus no Brasil”; “Folha de Lótus, Escorregador de Mosquito”; e “A Longa Marcha dos Grilos Canibais”

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